Amour, 2012. Dirigido por Michael Haneke. Com Emmanuelle Riva, Jean-Louis Trintignant e Isabella Hupert.
Nota: 9.4
Michael Haneke é um daqueles
diretores que seus filmes são mais do que simples filmes, são acontecimentos
cinematográficos. Desde seu arrebatador Violência
Gratuita (97), que assombrou o mundo cinematográfico e o elevou ao status
de diretor impactante e inovador, vem sendo benquisto em festivais e premiações
com produções requintadas voltadas para a análise do comportamento humano em
situações limite. Em Amor, o diretor
aponta seu olhar para o crepúsculo da vida, e como este sentimento profundo
pode se manifestar de formas inimagináveis, certas ou erradas.
O casal Anne (Emmanuelle Riva,
perfeita) e Georges (Jean-Louis Trintignant, excepcional) são idosos totalmente
independentes de qualquer cuidado externo. Passam os dias somente na companhia
um do outro, frequentando teatros e lendo bons livros. Partilham alegrias e
problemas, sendo um exemplo de casal que se ama e se respeita mesmo depois de
tanto tempo de convivência. Porém, quando Anne sucumbe ante um AVC e passa a
ser dependente dos cuidados de Georges, mais do que nunca o amor terá que
prevalecer, mesmo que este os leve a escolhas difíceis.
Haneke é um mestre em se
aprofundar nas mais diversas questões do comportamento humano, aqueles que
normalmente não são convencionais. Mesmo que o filme seduza o espectador a
encontrar uma história simplista, com o passar do tempo percebe-se que o amor
que está falando é aquele verdadeiro, que se manifesta em momento em que se
exige companheirismo e compreensão. Tudo bem que o diretor faz questão de
deixar que o público sinta a agonia dos personagens, primando pelos closes,
extraindo o pior de cada situação apresentada, mas cada sequência fala muito
mais com o silêncio angustiante, exposição do vazio e a lentidão que precede o
inevitável.
Os personagens estão isolados,
sozinhos, premeditadamente conduzidos ao fim sombrio. O que em Haneke não é
incomum. Assim se faz em todos seus longas anteriores, principalmente nos
recentes Cachê (05) e A Fita Branca (09), em que a
transformação, o perturbador e a insanidade de atos caminham ao lado de uma
verdade intrínseca, de conhecimento público, mas que a maioria tem medo de
deixar aflorar. No caso de Amor, a
vontade de se fazer o que é certo, ou o que o sentimento no coração manda,
predomina e leva há uma escolha que só quem ama verdadeiramente seria capaz de
fazer. O espectador pode desaprovar, mas o diretor deixa claro que só existe
uma condição de analisar o fato: se colocando na situação.
A proximidade que alcançamos com
os protagonistas aumenta o pavor, e mesmo perante ao déficit de falas, não de texto,
o enfado não se mostra presente como é comum neste tipo de filme, pois o magnetismo de saber o que levou ao
desfecho apresentado logo no início eleva as expectativas. Emmanuelle Riva, no
auge de seus 85 anos, mostra uma lucidez invejável e não exagera, se mantém em
um nível que assusta pela realidade, mas faz com que as atitudes de Geoges se
justifiquem. O personagem de Jean-Louis Trintignant tem uma intensidade ainda
mais sofrível que o da companheira. Está lúcido e encarando os problemas da
amada e ainda enfrentando os problemas externos aos quais Anne foi privada. Uma
atuação para não ser esquecida.
Amor é
em meio a tantos libelos da carreira de Michael Haneke, sua obra de arte no que
diz respeito ao seu talento para a análise da psique humana. Um retrato
romântico, melancólico, assustador e compreensível da nobre essência do
sentimento tão falado, mas pouco praticado pelo mundo atual. Amar é muito mais
do que dar presentes, dizer palavras bonitas ou planejar um futuro de regalos,
é saber se fundir em um só corpo, uma só mente, é fazer escolhas que podem ser
controversas, mas que beneficiarão aquele para quem se vive. Haneke sabe o que
está fazendo.
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