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quinta-feira, 26 de abril de 2012

DEZ GRANDES INTERPRETAÇÕES FEMININAS


O poder das personagens femininas na história do cinema é lendário. Lendas que saem do papel e se tornam inesquecíveis por conta do talento de suas intérpretes. Românticas, polêmicas, loucas, lutadoras, vilãs. Todas assumem com maestria sem igual seu papel decisivo em filmes tão inesquecíveis quanto às lembranças de uma atuação marcante. Listamos aqui dez entre tantas outras atuações inesquecíveis na história:


BETTE DAVIS (A Malvada, 1950)


“Quem é ela (Margo)? Além de um nome luminoso em cima de uma marquise. Além de algo chamado temperamento que consiste quase em voar por aí numa vassoura e gritar com o máximo de sua voz.”
Margo Channing

Bette Davis nem precisou necessariamente ser a malvada da história para brilhar. A personagem é mitológica e sua atuação lendária. Embora a atriz tenha carregado o estigma de ser a malvada de Hollywood, aqui sua personagem foi a mocinha das armações intrigantes de uma ambiciosa aspirante à atriz. Ao dar a mão para alguém que acolheu afeiçoadamente, ela nunca poderia imaginar que este gesto de nobreza lhe custaria sua carreira. Este episódio faz com que a estrela enxergue uma nova perspectiva em sua vida, redescobrindo seus outros talentos. Bette conduz este clássico de Joseph Mankiewicz na palma da mão fazendo de sua Margo Channing algo inesquecível por gerações. Uma personalidade geniosa, uma ironia charmosa e um talento soberbo, definem tanto as características da personagem quanto da própria atriz. Talvez sejam estas as razões do sucesso de ambas dentro e fora das telas.  A construção perfeita da veterana estrela, que aliada a um roteiro brilhante e um texto fenomenal, coloca como uma das grandes interpretações da história. Muito maior do que não ter levado o Oscar daquele ano.  Algo inominável na carreira de uma das maiores atrizes do cinema.

Esta poderia valer um Oscar: todas as sequências de Margo foram memoráveis. Mas para melhor aproveitar o brilhantismo do texto de Mankiewicz, expressarei por meio dele uma das melhores do filme, quando Channing abre seu coração para sua melhor amiga Karen (Celeste Holm) durante uma viagem: “Engraçado a carreira da mulher, as coisas que abandona na subida da ladeira pra poder deslocar-se mais depressa. Esquece que precisará delas novamente quando voltar a ser mulher. Esta é uma carreira que todas temos em comum, quer gostemos ou não. A de ser mulher. Cedo ou tarde temos esta preocupação. Não importa quantas outras carreiras tenhamos desejado.”


VIVEN LEIGH (Uma rua chamada pecado, 1951)


“Direita? O que é direita? Uma linha pode ser direita ou uma rua. Mas e o coração de um ser humano?”
Blanche Dubois



Onze anos após ter faturado seu primeiro Oscar por E o vento levou ao dar vida à lendária Scarlett O ‘Hara, a inglesa de expressões fulminantes voltou a surpreender e, neste caso mais específico, mexer com os brios do público e chocar a censura da repressora década de 50. Vivien Leigh brilhou na penumbra espiritual de sua personagem numa atuação tão estarrecedora quando o olhar vívido da indecifrável Blanche Dubois. Uma mulher que personifica uma clara profundidade no espírito de opressão sexual às mulheres daqueles tempos. Sua vida não consegue seguir a rua de todas da época. A facilidade que tem em conduzir sua vida de paixões ocasionais lhe confere um estigma um tanto cruel. Libertina ou apenas uma mulher que não soube se fazer amar para a época? Uma questão que permeou e continuará permeando os pensamentos de todos que vivenciam o sucesso de sua interpretação neste clássico de Elia Kazan. A parceria lendária com Marlon Brando não só premiou a atriz com o Oscar, como também a coragem de elevar à personagem a uma categoria dantes esquecida por uma sociedade puramente conservadora. Inesquecível como um clamor bem sucedido ao bater de frente com o paradigma sexual que separa os atos moralmente contestáveis entre homens e mulheres.

Esta valeu o Oscar: numa sequencia de aproximadamente 10 minutos, Blanche (Leigh) expõe ao apaixonado Mitch (Karl Malden) seu passado libertino e as razões que supostamente a conduziram para tal destino. O julgamento da moralidade da personagem fica a cargo subjetivo do público graças à extraordinária interpretação da atriz, que vai da doçura à loucura em frações de segundos.


AUDREY HEPBURN (My fair Lady, 1963)

“Eu vendia flores, não vendia a mim mesma. Agora que você fez de mim uma dama, não sirvo pra vender mais nada.”
Eliza Doolitle

Uma princesa tornando-se uma plebeia por si só é algo para se chamar atenção. Nota-se que a afirmação não se refere à Eliza Doolitle, personagem marcante na carreira da querida Audrey Hepburn. E sim à própria atriz, que teve que passar por uma incrível metamorfose para desmistificar a imagem majestosa que sempre a acompanhou. Ao encarnar com a maestria que lhe é habitual, uma florista ignorante, enfeitou com música a realidade das mulheres sonhadoras. No filme, sua personagem se torna protagonista de uma aposta feita por um arrogante professor de etiqueta e seu velho amigo. Transformar a fera numa bela capaz de fascinar toda uma corte. Embora as canções do musical não tenham sido interpretadas por ela, é preciso ressaltar o esforço que teve em gravar estas mesmas canções. Sua voz foi substituída por questões que eximem seu talento latente tanto nas sequências da embrutecida florista com suas interjeições, quanto na sutileza deslumbrante da querida dama. Um show para quem aprecia excelentes performances em todos os níveis de representação.

Esta poderia valer o Oscar: a sequência do Jóquei Club é memorável, pois sintetizou de forma cômica os dois lados de sua personagem. A florista e a dama. Mas é na forma dramática que Audrey melhor destaca os dois lados de Eliza quando a criatura se rebela contra seu criador Henry Higgins (Rex Harrison) depois do esperado Baile da Realeza. A dama fez de tudo para ser vista como um ser humano e não um mero objeto de barganha de seu professor. Uma cena brilhante, comovente e inesquecível.



JULIETE LEWIS (Cabo do Medo, 1990)

“Sempre achei que para um rio tão lindo, o nome era ilusivo: Cabo do Medo. A única coisa a temer naquelas mágicas noites de verão era que a Magia acabaria e a realidade invadiria.”
Danielle Bowden

Que qualquer adolescente passa por momentos de estabilidade emocional é um fato mais que conhecido no campo da psique humana. A famosa fase em que tentamos nos encaixar no novo mundo que nos é apresentado, e, geralmente da forma mais traumática. Deixar pra trás toda a pureza da inocência e defrontar com uma realidade que elimina o conforto de nossos pensamentos precedentes. Complicado? A jovem Danielle Bowden sentiu na pele e na alma toda esta fase de descobertas, ao se perder por caminhos nada confiáveis por conta disso. Sentindo-se reprimida pela superproteção dos pais, ela responde através da descoberta do poder de sua sexualidade. Assim, ela torna-se uma presa fácil nas garras do fascinante vilão. Aos poucos, todo este fascínio se transforma em pesadelo quando descobre o verdadeiro propósito deste envolvimento. Uma personagem que poderia carregar consigo certa trivialidade, se não fosse pela atuação brilhante de uma das melhores atrizes que o cinema já teve. Juliette Lewis consegue tornar o filme de Scorsese um suspense inesquecível sempre que surge em cena de forma segura, deixando transparecer a fragilidade erótica de sua personagem juntamente com a força descomunal de seu talento. Indicada ao Globo de Ouro por este trabalho, até hoje é uma incógnita perturbadora o porquê de não ter se repetido a mesma indicação ao Oscar.

Esta poderia valer um Oscar: Oito minutos determinaram com precisão as nuances de Danielle (Lewis). Quando se encontra com seu suposto professor de teatro no colégio, a garota está certa de que finalmente encontrou as respostas que tanto desejara. Mas à medida que o tal professor se apresenta como o vilão Max Cady (Robert de Niro), a menina ingênua se deixa levar pela forma inteligente e erótica de Cady a um ardente beijo no final. Assustada com a invasão daquele momento, ela descobre que às vezes estas descobertas não são como idealizadas, e que uma evasão racional num momento propício é a melhor saída.


KATE WINSLET (Almas gêmeas, 1994)

“As melhores pessoas tem doenças como as nossas. Isto tudo é incrivelmente romântico.”
Juliet Hulme

Uma atriz na mais concepção da palavra precisa de um início acachapante. Aos 17 anos, Kate Winslet já dava sinais da extensão promissora de sua carreira. Neste filme de Peter Jackson, baseado numa história real, ela encarna a personalidade apaixonante da jovem sonhadora Juliet Hulme, que devido à profissão de seu pai, tende a mudar de uma cidade para outra constantemente. Com dificuldades para fazer amizades, ela encontra numa colega de escola sua alma gêmea. Ou seja, a única pessoa que podia compreendê-la no mundo e amá-la do jeito que fosse. Ao acompanharmos o filme é impossível dissociar a imagem de uma personagem com algum tipo de distúrbio mental. Mas é exatamente na preposição deste distúrbio, que observamos a caracterização de uma jovem comum, dotada de um espírito indomável, cheia de sonhos, aspirações. A repressão do desejo por liberdade individual a leva inadvertidamente a um caminho imaginário e sem volta. O que ela, juntamente com a amiga, chama de a quarta chave. Por meio deste caminho, a imaginação choca-se com a realidade de um crime inimaginável. Acostumada a interpretar personagens complexas, Kate mergulha na essência romântica bem como na loucura imaginária de Juliet. Outros trabalhos excepcionais marcariam daí por diante sua carreira graças ao impacto fulminante da porta que lhe abriu a garota Hulme.    

Esta poderia valer um Oscar: todas as sequências da personagem foram brilhantes, mas uma em especial, sintetiza melhor a repressão a qual ela lutava mesmo diante de uma compreensão avulsa. Quando é informada pelos pais de que terá de partir com eles mais uma vez, ela corre desvairada pelos campos imensos numa clara alusão de que se encontra perdida em seu mundo. Ao cair em prantos, é resgatada pela amiga Pauline (Melanie Linskey) e opta pela fuga de escapismo mais uma vez. 


HILLARY SWANCK (Meninos não choram 1998)

“O futuro me assusta.”
Teena Brandon

Ser menino ou menina no mundo em que vivemos é uma coisa irrelevante quando se consegue captar a essência humana em ambos os lados da moeda. Numa performance excepcional, Hillary Swank se transformou literalmente num garoto para dar vida e voz a Teena Brandon, uma garota perdida em sua própria identidade sexual, mas que possuía sonhos incompreendidos por uma intolerância cruel. O desafio da atriz não se limitou em se caracterizar fisicamente em um rapaz. Foi preciso captar o interior da personagem, dar vida a seus sentimentos, sonhos, e especialmente, seus desejos. Teena não se achava uma garota. Ao tentar levar corajosamente a vida que queria, acabou tendo um desfecho trágico. Seus sonhos de liberdade foram interrompidos pela violência regida sob a forma preconceituosa de alguns em enxergar o ser humano como um todo. Swank se preocupa mais em focar o lado humano de Teena. O público é tragado por suas aspirações e se comove com seu drama no filme de Kimberly Pierce. Um êxito raramente visto no cinema. A história comovente da garota que virou um baluarte da luta homossexual ganhou mais força através do trabalho desta atriz de expressões marcantes, sorriso cativante e talento notável.

Esta valeu o Oscar: Do início ao fim, o trabalho de Swank é formidável. E em meio ao drama carregado por palavras e ações, é numa cena silenciosa que ela nos apresenta sua Teena. Ants de seu fim, a atriz expõe com a clareza do coração, um olhar calmo, esperançoso um leve sorriso inebriante. Assim, ela mostra o quanto se identifica com o ser humano em geral.


NICOLE KIDMAN (Moulin Rouge, 2001)

“Por dentro meu coração está partido, minha maquiagem pode estar borrada, mas meu sorriso é o mesmo porque o show tem que continuar.”
Satine

A florzinha frágil, a alegre energética, a sedutora ardente. Nicole Kidman foi tudo isso ao compor uma das mais belas e apaixonantes personagens do cinema neste esfuziante musical de Baz Luhrmann. A cortesã Satine era o mais reluzente diamante da clássica Moulin Rouge, o local mais frequentado de Paris no início do século XX. Como toda bela mulher daqueles tempos luxuosos, seu destino foi o de arrancar suspiros e evocar o amor dos corações mais incautos. Protagonista de grandiosos espetáculos, a bela de olhos azuis brilhava intensamente sob seus holofotes até chamar a atenção de dois distintos pretendentes. O autor (o tocador de cítara) e o Duque (Marajá). Dois exemplos personificados do fascínio que o diamante exercia não só em seus apaixonados fãs, mas como também no público que acompanhou sua trajetória de amor. Ao optar pelo amor ao lado do paupérrimo autor, a cortesã não imaginava que este momento traçaria sua vida e sua morte. Belíssima, Nicole enche a tela toda e se torna maior que o filme, tanto nos momentos românticos, quanto nos momentos dramáticos. Ganhadora do Globo de Ouro e indicada ao Oscar por este show eloquente de corpo e voz, a estrela conduz com fidelidade o objetivo de sua personagem. O de representar. Como bem fala em uma das passagens do filme: “Sou uma atriz de verdade.”  

Esta poderia valer um Oscar: sempre há aquelas cenas em que precisam ser congeladas para ficar pra sempre na memória. Uma delas é a da apresentação triunfal da deslumbrante Satine em um dos shows do Moulin Rouge. No momento em que, sem saber do mal entendido, conhece seu amor. Beleza, talento, sedução e carisma arrasaram os corações no salão.


CHARLIZE THERON (Monster – desejo assassino, 2003)

“Eles reconheceriam meu potencial e a minha beleza como um diamante em estado bruto.”
Aileen Wuornos

Numa das mais perfeitas metamorfoses do cinema, a estonteante Charlize Theron se transformou em Aileen Wuornos, uma mulher que caminhou insolitamente pelo corredor da morte. Aileen era o tipo de mulher que não fazia de sua beleza uma arma para alcançar seus objetivos neste filme de Patty Jenkins. De uma menina sonhadora a uma assassina, sua trajetória foi impressionante. Diante de muitas dificuldades, ela se torna uma pessoa embrutecida pela violência depois de matar um de seus clientes que a violentou, o primeiro de uma série. Ao conhecer uma parceira que lhe dá o devido apoio em sua condição de vida, ela esperava tomar as rédeas de seu destino, mas acabou se sufocando na marginalidade. Em uma atuação monstruosa, a bela sul-africana encarna de forma perfeita sua personagem em todos os níveis. A caracterização física, os trejeitos, e, o mais fundamental, a humanização de seu “monstro”. Esta certamente é o maior mérito de Charlize, vencedora do Oscar, que imprime uma empatia, compaixão e até um heroísmo oculto em Aileen. Além disso, ela não se deixa ater por clichês, focando mais na personagem do que no julgamento dos motivos pelos quais ela ter se desviado por este caminho.

Esta valeu o Oscar: numa maratona de cenas difíceis, destaque para quando Aileen (Theron) é violentada. As emoções da personagem chegam ao limite entre a razão e a irracionalidade depois que num ato de sobrevivência, ela atira impiedosamente em seu cliente (Lee Tergensen).  A desorientação da personagem logo ganha um fundo de obscuridade de um futuro sombrio.


MARION COTILLARD (Piaf – Um hino ao amor, 2008)

“Não posso fazer isso? De que adianta ser Edith Piaf então?”
Edith Piaf

A vida íntima de uma grande artista foi o que motivou Marion Cotillard a embarcar em uma emocionante aventura pelos caminhos ora românticos, ora dramáticos, no filme de Olivier Dahan. A atriz mergulhou de cabeça na síntese de composição de sua personagem. Foi assim que ela a viu desde o início, pois não queria fazer uma simples imitação de alguém tão expressiva na história da música mundial.  Foi preciso compreender a alma e o coração da fabulosa Edith Piaf. Lá estavam eles, inseridos entre o romantismo melancólico de suas músicas e o turbilhão de emoções de sua vida pessoal. Requisitos formidáveis para qualquer artista brilhar por meio de seu talento. Assim se fez. Ao transpor uma identidade própria a sua Piaf, a atriz optou por se deslocar de um trabalho meramente biográfico. Em outras palavras, ela deixou transparecer a mulher Edith. Uma artista de coração apaixonante, personalidade arrebatadora e carisma excepcional. A força de sua história bem como as emoções nela inseridas fundiu-se numa só pessoa. A fantástica maquiagem e da dublagem nos números musicais só veio reforçar um trabalho tão magnífico quanto à carreira e a vida da estrela francesa.

Esta valeu o Oscar: a magnitude da personagem criada por Cotillard se concretiza na sequência em que a cantora se depara com a realidade da morte de seu grande amor em um acidente aéreo. Ali, o sentimento lúgubre se sobressai na música que compôs para Marcel (Jean Pierre Martins) junto com a fragilidade desnuda da mulher Edith.



NATALIE PORTMAM (Cisne negro, 2010)

“Sua garotinha? Ela se foi!”
Nina Sayers

A busca pela perfeição delineou a trajetória da esplendorosa personagem de Natalie Portman no fascinante filme de Darren Aronofsky. O tema colidiu imensamente com o propósito de Nina Sayers. Uma bela bailarina dotada de um grande potencial, mas que por ainda se encontrar adormecido na trivialidade de seu espírito, era um obstáculo para sua promissora carreira. Depois que consegue o papel de seus sonhos como a primeira bailarina de uma renomada companhia de balé, a moça tende a passar por um intenso processo de metamorfose psicológica para interpretar os dois papéis de O Lago dos Cisnes. O cisne branco e o cisne negro deveriam se fundir em sua alma para que assim, seu corpo pudesse dar uma resposta à esperada perfeição. Com a ajuda do dedicado professor e de uma colega de personalidade oposta, todo o esforço de atriz e personagem teve seu ápice em uma das melhores apresentações do famoso espetáculo. Natalie esteve perfeita como o cisne branco na descoberta psicológica de sua sexualidade, e espetacular como o cisne negro na reafirmação física desta descoberta. Uma fusão de corpo e alma raramente vista na história do cinema. Tanta perfeição não poderia ter outro resultado que o Oscar de melhor atriz de 2010.

Esta valeu o Oscar: os efeitos especiais podem até ter ajudado, mas é a síntese emocional da cena que celebramos a perfeição almejada por Nina (Portman). A desenvoltura do seu Cisne Negro enche a tela com um brilho fenomenal. Através de seus passos, seguimos inebriados pela performance de uma atriz que se entrega de corpo e alma ao projeto.


terça-feira, 24 de abril de 2012

Titanic (1997)


Titanic, 1997. Dirigido por James Cameron. Com Kate Winslet, Leonardo DiCaprio, Kathy Bates, Gloria Stewart e Billy Zane.Nota: Nota: 9.1

Era uma noite gelada do dia 14 de Abril de 1912 em que o destino de mais de 2000 pessoas a bordo do maior transatlântico da história foi selado. A viagem inaugural do Titanic encerrou-se após colidir com um iceberg em pleno Oceano Atlântico. Para muitos uma fatalidade, para outros uma tragédia anunciada.

A avaliação da quantidade de botes a bordo do navio naquela noite, traça um perfeito perfil da falsa segurança que os responsáveis pelo navio apresentavam. Sessenta e quatro era a capacidade total e embarcaram apenas 20 deste total. Segundo os cálculos, se tivessem embarcado todos estes 64, dariam para ter salvado quase o dobro da tripulação. A mesma falsa segurança originou a desatenção na condução do navio e a colisão com o impiedoso iceberg foi o estopim para o desastre. E não devemos esquecer também da famosa frase “nem Deus afunda o Titanic”, que agora ecoa como uma clara demonstração de soberba do homem. Homem que afundou e ainda afunda de forma titânica quando o assunto é o respeito por seus próprios semelhantes.

A construção do chamado “o navio dos sonhos” teve como ponto primordial a linha divisória entre ricos e pobres, ou seja, entre primeira e terceira classe. Embora este fosse o padrão para a construção dos navios da época, é impossível não se revoltar com a falta de humanidade com que tratavam os menos favorecidos. Diante deste valioso argumento, o diretor James Cameron trouxe seu Titanic para as telas em 1997. Rapidamente o filme tornou-se um sucesso de bilheteria, um fenômeno Cult e um dos melhores de todos os tempos. A minúcia com que o diretor retratou os episódios capitais da história do naufrágio, aliada aos efeitos especiais espetaculares para a época e à fantástica história de romance intersocial, arrancou mais que uma simples emoção do espectador. Foi um puro deleite para quem gosta de acompanhar uma bela obra de arte do cinema.

James fez de seu Titanic algo indestrutível, inabalável, inundável. Era quase certo que seu projeto não teria o mesmo destino que o transatlântico homônimo. O trabalho perfeccionista incorporou a preocupação em se fazer cinema de verdade, tornando sua obra algo muito mais grandiosa que o próprio navio de 1912.

Com Cameron, todos nós, independentes da classe social, viajamos pelos corredores do navio, jantamos em suas luxuosas porcelanas, dormimos em seus macios lençóis, amamos Jacks e Roses, sentimos na pele o sofrimento de seus tripulantes e, no final, gritamos em alto e bom som: ”somos os Reis do mundo!” 

No Titanic de James Cameron embarcamos numa aventura que só o cinema nos proporciona. Este navio de sonhos onde nunca houve dissociação entre a tripulação e muito menos um iceberg inócuo à frente deles.

Que o sucesso do Titanic de Cameron perdure por mais de cem anos, como uma bela e emocionante homenagem a todos os incautos que embarcaram numa viagem insólita naquele gelado 14 de Abril.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Diário de um Jornalista Bêbado (2011)

The Rum Diary, 2011. Dirigido por Bruce Robinson. Com Johnny Deep, Amber Heard, Michael Rispoli, Giovanni Ribisi, Richard Jenkins e Aaron Eckhart.
Nota: 7,2

Quando Johnny Depp está envolvido em algum filme, seja como produtor, ou como ator, a expectativa no mundo cinematográfico em torno do resultado é sempre a melhor possível. Em Diário de um jornalista bêbado, adaptado da obra de um pioneiro do jornalismo gonzo, e amigo de Depp, Hunter S. Thompson, morto em 2005, o ator mostra toda sua capacidade de incorporar personagens excêntricos e diferenciados, porém o longa deixa a desejar com uma trama confusa e que envolve o público apenas em seus minutos finais.

O filme narra as aventuras de um dos alter egos de Thompson, Paul Kemp (Johnny Depp), no início de sua carreira em Porto Rico, onde se envolve com a linda Chenault (Amber Heard), mulher de um empresário, é coagido a forjar notícias favoráveis a um projeto obscuro, e, claro, se envolve com os mais bizarros tipos de bebuns.

O roteiro de Bruce Robinson, que também dirigiu o filme, não conseguiu transformar a bela matéria-prima que possuía do livro de Thompson em algo sedutor. Por quase noventa minutos privilegia os clichês básicos que compõem o cinema de Hollywood, dando importância ao insosso affair de Paul com Chenault, e a oposição ao seu noivo malvado. Exagera nas cenas escatológicas de seu companheiro Bob Sala (Michael Rispoli), na mais excessiva delas, Depp dirige um carro caindo aos pedaços, sentado no colo de seu cômico amigo. Além disso, a forma como mudou a posição do protagonista em relação aos planos ambiciosos dos empresários foi superficial.

A direção é frágil, sendo que Robinson não soube aproveitar o bom cenário que tinha à disposição. Apesar da boa descrição de tempo e lugar de sua direção de arte, a falta de direcionamento do gênero em que estabeleceria a narrativa provoca grande confusão ao público. Ao mesmo tempo em que se arrasta nas sequências de romance, introduz um ritmo acelerado da comédia pastelão, além de tentar dar um certo ar de suspense quando os jornalistas resolvem enfrentar os corruptos. Tudo isso provoca confusão e falta de coesão entre as pequenas tramas.

Por ter sido amigo do jornalista, Depp se propôs a interpretá-lo neste longa, antes mesmo do material virar livro em 1998. O resultado foi uma excelente atuação, no mesmo nível que em Medo e delírio, no qual interpretou outra personalidade do escritor, porém mais afundado nas drogas pesadas e na loucura. Um bom filme para quem deseja alguns momentos de puro entretenimento, mais muito pouco para honrar a memória de Thompson.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Fúria de Titãs 2, 2012

Clash of the Titans 2, 2012. Dirigido por Jonathan Liebesman. Com Sam Worthington, Liam Neeson, Ralph Fiennes e Toby Kebbell.
Nota: 6,8

Ao assistir o trailer é até possível que o público chegue a acreditar que iria ver um filme que fizesse justiça ao grande universo místico e fantástico da mitologia grega. Porém, Fúria de Titãs 2 se mostra tão pobre em roteiro quanto o primeiro, de 2007, além de apresentar uma visão exageradamente deteriorada do contexto literário, procurando valorizar a ação frenética e os clichês hollywoodianos.

Depois de cortar a cabeça da Medusa e derrotar o monstruoso Kraken no primeiro longa, agora o herói Perseu (Sam Worthington) tem de ir até o mundo inferior e salvar seu pai, Zeus (Liam Neeson), aprisionado por Ares (Edgar Ramirez) e Hades (Ralph Fiennes), para que pudessem libertar o grande titã Cronos. Mas, que para que sua missão tenha sucesso, irá contar com a ajuda de um outro semi-deus, Agenor (Toby Kebbell) filho de Poseidon, e da rainha Andrômeda (Rosamund Pike), pela qual sente uma atração.

Todo o filme é construído sobre a mesma plataforma que foi feito na primeira aventura. Do início, em que o protagonista recusa seu papel para com a humanidade, o envolvimento emocional com um familiar, que, no caso, é o filho, e o pulo de cabeça na ação quase ininterrupta, assim como em Fúria 1. Os roteiristas abusam do direito à liberdade de adaptação e criam uma visão que causará grande desconforto para os fãs da obra milenar.

Os clichês básicos do cinemão americano exalam a cada sequência em que as piadas prontas do totem cômico representado pelo semideus Agenor, aliado ao clima meloso, meio forçação de barra, da relação pai e filho, aqui dividido em duas gerações. Para completar a paçoca, a trama não resiste a uma tensão romântica e joga Perseu para cima da rainha da Grécia.

O diretor Jonathan Liebesman mostra que adora trabalhar com efeitos visuais megalomaníacos e, assim como fez em A Batalha de Los Angeles, consegue criar sequências com um excessivo uso de explosões, monstruosidades e pancadarias. Não consegue apresentar algo mais atrativo ao público, que, dificilmente, não sairá do cinema com a sensação de ter visto a mesma coisa em alguns outros filmes.

É provável que padeça no esquecimento, tendo em vista que tem a concorrência de John Carter e Jogos Vorazes, que são melhores, e Os Vingadores, que está para estrear. Com um clímax sem graça, que evidencia a falta de criatividade do roteiro, o longa tem tudo para desacelerar as adaptações da mitologia, que tem sido constante nos últimos anos, e cá entre nós, ninguém irá reclamar.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Albert Nobbs (2011)


Albert Nobbs, 2011. Dirigido por Rodrigo Garcia. Com Glenn Close, Mia Wasikowska, Janet McTeer e James 
Geene.
Nota: 7,8


Se a Mulher Maravilha tivesse em mãos um material tão interessante quanto à história de Albert Nobbs, certamente não o teria aproveitado melhor. A heroína de vestes patrióticas norte-americanas pode até ser dotada de poderes especiais, mas jamais teria a sensibilidade cinematográfica de fazer um filme no mínimo, interessante.

Neste caso, coube a veterana Glenn Close o papel de heroína desta trama ambientada na Irlanda do século XIX. O padrão social da época ditava o caminho que teria de percorrer as mulheres que almejassem uma independência financeira.  Passar por alguém do sexo oposto foi a solução encontrada pela sonhadora Albert Nobbs. Sim, este era mesmo seu nome de batismo dado por sua mãe adotiva. O talento do mordomo de feições humanistas foi o responsável pelo sucesso do Hotel Morrison’s, local em que trabalhava junto a uma exigente clientela. A educação de raízes britânicas juntamente com carisma e sensibilidade, ajudou a alimentar seus sonhos. A cada dia de trabalho realizado com muito esforço e jogo de cintura, afinal, sendo uma mulher, havia trabalhos de maiores dificuldades neste sentido, preenchia sua poupança particular. No exílio de seu quarto ela escondia as economias de toda uma vida, acreditando um dia trabalhar pelos próprios interesses.

Tudo transcorria para este fim, até que chega o dia em que seu mundo particular é invadido pela figura enigmática de um inesperado colega de quarto que descobre seu segredo. Suas aspirações estariam com os dias contados se este suposto colega não fosse alguém como ela. Hubert Page (Janet McTeer) também se travestia de homem para poder sobreviver. E o que é melhor. Seu plano tivera tanto êxito que sustentava um negócio próprio, uma parceira conjugal (Bronagh Gallagher) e uma personalidade independente. Tudo que Albert mais aspirava.

Aos poucos, a experiência do “colega” começa a conduzir Albert a imaginar uma vida semelhante ao lado da colega de trabalho Helen Dorse (Mia Waskowska). Uma garota doce, gentil, mas que não tinha a força de personalidade que esperava. Helen se envolve com um rapaz de má índole, passando aí se aproveitar do dinheiro e da boa vontade de Albert para com ela. Como tudo que começa mal, não termina bem, a bela jovem acaba pagando um alto preço por seu equívoco. Preço que custou mais caro ainda na conta de Albert, que acabou se vitimando emocional e fisicamente durante todo este episódio.

O heroísmo da personagem título bem se reflete em sua intérprete. Albert não alcançou o que pretendia, mas suas boas ações acabam no final por aproximar as duas pessoas que ela mais tinha apreço. Helen e Page. Para uma heroína a abdicação de um final feliz em prol dos outros, mesmo que incidentalmente, é mais que um ato heroico, é um gesto de amor. Seguindo esta linha, sua intérprete demonstrou poderes especiais na construção do filme. Além de atuar, a inglesa Glenn Close compôs a belíssima canção do filme, cantou, ajudou no roteiro e na produção. Em suma, contribuiu e muito, na elevação da qualidade de seu Albert Nobbs, que embora não tenha figurado na extensa lista de candidatos ao Oscar de melhor na categoria, soube cumprir bem seu papel no quesito emoção.

A maquiagem, o figurino, e especialmente as atuações de Close e McTeer, supriram algumas lacunas deixadas pelo roteiro. Ambas fazem um trabalho perfeito salientando suas indicações ao Oscar. Obra de qualidade para quem curte grandes interpretações. McTeer deu a Page uma austeridade convincente e uma integridade cativante, enquanto Close, a heroína de 2012, transformou seu Albert Nobbs em algo impressionante com seus poderes extraordinários de talento e versatilidade. Atributos que ainda falta à Mulher Maravilha e seu chicote mágico.









segunda-feira, 16 de abril de 2012

VENCEDORES DO 1º PRÊMIO FORREST DE CINEMA



Durante pouco mais de um mês a enquete ficou aqui no blog para que os visitantes tivessem a oportunidade de votar nos melhores indicados por nós. Apesar de não ter tido muitos participantes, a eleição mostrou algumas surpresas em relação a outra premiações, como o Oscar. A promessa do blog é que o ano que vem, haja uma minúcia maior na escolha dos indicados. Agradeço aos que participaram e vamos aos vencedores.
MELHOR FILME
 
O Artista

MELHOR DIRETOR
Michel Hazanavicius – O Artista

MELHOR ATOR
Jean Dujardin – O Artista

MELHOR ATRIZ
Viola Davis – Histórias Cruzadas

MELHOR ATOR COADJUVANTE
Brad Pitt – A Árvore da Vida

MELHOR ATRIZ COADJUVANTE
Octavia Spencer – Histórias Cruzadas

MELHOR ROTEIRO ORIGINAL
Meia-noite em Paris

MELHOR ROTEIRO ADAPTADO
Os Descendentes

MELHOR MONTAGEM
O Artista

MELHOR FOTOGRAFIA
A Árvore da Vida

MELHOR FILME ESTRANGEIRO
O Garoto da Bicicleta

MELHOR FILME DE ANIMAÇÃO
As Aventuras de Tintin – O segredo de Licorne

MELHOR FILME NACIONAL
O Palhaço

ATOR REVELAÇÃO
Tom Hardy

ATRIZ REVELAÇÃO
Rooney Mara

quinta-feira, 12 de abril de 2012

As Horas (2002) - Comemorativo 10 anos



The hours, 2002. Dirigido por Stephen Daldry. Com Nicole Kidman, Julianne Moore, Meryl Streep, Ed Harris, John C. Reilly, Miranda Richardson, Stephen Dillane e Claire Daines.
Nota: 9.4

As horas é uma obra que já nasceu consagrada. Inspirado no revolucionário Mrs. Dalloway, romance da enigmática escritora Virginia Wolff, virou sucesso 70 anos depois nas mãos do escritor Michael Cunningham. Eleito o melhor livro de 1998, vencedor do Pulitzer e do PEN / Faulkner, foi classificada como uma obra não linear e cheia de nuances. Mas isso não faz do livro um bicho de sete cabeças. Pelo contrário. Foram estas características que fizeram com que esta belíssima obra tivesse uma transição segura para o cinema.

Diante de tanto reconhecimento, coube ao talentoso diretor Stephen Daldry, famoso por tornar físico o mundo interior, dar vida às suas instigantes personagens nas telas. O primeiro desafio foi fundir as três histórias e assim, criar uma única narrativa sob a mesma temática com pontos de vista diferenciados para que pudesse surgir uma melhor interação entre elas.  “Achei que a ideia de se ter três histórias, três mulheres e a relação entre elas, era uma maravilhosa oportunidade de tentar criar uma única narrativa.”

Outro desafio foi tentar dar corpo às vozes do interior das personagens naturalmente captadas no livro. Mostrar o espectro que assombra a vida aparentemente normal de cada uma delas. Esteio que ajudou a conduzir fielmente o roteiro de David Hare bem como o trabalho de suas intérpretes.

O filme parte de 1923, ano do processo de criação de Miss Dalloway. Da genialidade à loucura, todos os sentimentos da escritora Virginia Wolff (Nicole Kidman) captados pelas páginas de uma de suas maiores criações. A relação tênue entre amor e ostracismo sentimental para com o marido Leonard (Stephen Dillane), a fidelidade quase que incestuosa para com sua irmã Vanessa (Miranda Richardson), a vida soturna inserida em seu mundo particular, e a angústia exasperante em seus últimos dias. A angustia asfixiante que sufocam seus pensamentos, e a ideia de uma liberdade individual, a levam a um destino inacreditável. A belíssima Nicole Kidman fica irreconhecível no papel da excêntrica escritora, captando com maestria sua personificação física e especialmente, emocional.

Paralelo a isso, em 1951 se encontra a dona-de-casa Laura Brow (Julianne Moore), que teve todos seus desejos de mulher dizimados pelo pragmatismo da sociedade americana. O dia de Laura parece comum a todos os dias de uma mãe de família e senhora do lar. Apesar de bem casada com Dan (John C. Reilly), um marido extremamente devotado, a dor da frustração de não poder expressar seus desejos, a torna uma mãe e esposa tão robótica que sua convivência com o filho transforma-se numa dor desconfortante. As emoções de Laura são captadas em cenas onde o silêncio assume o papel de protagonista. Este silêncio é o que alimenta sua força para tomar a mais séria decisão de sua vida. Tudo isto mesclado com uma interpretação soberba da excelente Julianne, torna inesquecíveis suas sequencias.  

O ano é 2001 e seguimos ao lado de Clarissa Vaughn (Meryl Streep), uma editora que adora dar festas para esconder sua melancolia de seus sonhos enterrados. Clarissa é do tipo de mulher que constantemente assombrada pelo seu passado, não pode viver plenamente seu presente, agarrando-se a uma ideia de felicidade surreal. Sua vida com a parceira Sally (Allison Janney), bem como a relação com a filha Julia (Claire Danes), é minada pela devoção integral para com seu amigo Richard (Ed Harris, ótimo), um poeta frustrado que está em seus últimos dias vítima da AIDS. Clarissa e Richard tiveram uma única noite de amor na juventude. Desde então, esta noite se tornou todos os seus dias. É a partida de Richard que faz com que ela se volta para seu mundo. Meryl Streep empresta toda sua majestade ao dar ênfase aos momentos de emoções ponderadas de Clarissa.

Três mulheres em épocas diferentes, mas com os mesmos anseios de felicidade, oriunda de uma firmação pessoal. Três histórias interligadas pelos pensamentos capciosos de Virginia ao escrever Mrs. Dalloway. O romance lido por Laura anos mais tarde, e sintetizado na figura de Clarissa posteriormente. O triunfo do filme consiste em ligar emocionalmente suas três histórias ao romance, que narra a história de uma mulher, uma heroína diante das dificuldades cotidianas, se personificando em todas as mulheres. Personagens que tendem a praticar atos de heroísmos constantes, a cada 24 horas. Partindo do ponto de ter que estar sempre provando para a sociedade seu valor subjugado. Fato que ultrapassa gerações. “Acredito que o heroísmo na vida das mulheres é constantemente subestimado, ou posto em segundo plano em comparação ao heroísmo na vida dos homens. Obviamente, os esforços são enormes e profundos, e possui a mesma importância”, Stephen Daldry.

Em As horas acompanhamos atentamente o dia destas três mulheres e descobrimos o que estes valiosos minutos nos revelam diante da complicada arte de viver. As relações pessoais, a inquietação sentimental e a dissimulação dos sentimentos. Observações que inadvertidamente podem nos conduzir a repressão das qualidades, direitos e responsabilidades de mulher. As tribulações sentimentais podem dar ao filme um ar de melancolia, mas é certo afirmar que todo este sentimento se esvai com o êxtase de acompanhar três atuações heroicas e históricas. Algo para se aplaudir a cada minuto, cada dia, cada hora, cada ano. Sempre.  

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Jogos Vorazes (2011)

  
Hunger Games, 2011. Dirigido por Gary Ross. Com Jennifer Lawrence, Josh Hutcherson, Wes Bentley, Woody Harrelson, Stanley Tucci e Donald Sutherland.
Nota: 8,8

Muita gente está órfã de aventuras juvenis depois do encerramento da saga do bruxinho Harry Potter e do derradeiro final do romance vampiresco alternativo da saga Crepúsculo. Depois de Percy Jackson tentar, sem sucesso, preencher a lacuna, chegou a hora de Jogos Vorazes, adaptação do best-seller de Suzanne Collins, entrar em cena com uma variação de futuro que nos remete a uma visão caótica de repressão do livro 1984, de George Orwell, auxiliado por boas atuações e atrativos cinematográficos bem dosados.

A história se passa em um futuro repressivo onde os Estados Unidos é agora Panem. Um grande país divididos em 12 distritos que todos os anos tem de oferecer dois jovens, os tributos, para participar de um reality show, que só vencerá aquele que matar todos seus adversários. Quando a menina Prim é sorteada, sua irmã Katniss (Jennifer Lawrence) se oferece para substituí-la no sangrento programa. Lá contará com a ajuda de Peeta (Josh Hutcherson), o outro jovem do Distrito 12, para sobreviver às provações impostas pelos organizadores do show idealizado a mando do Estado.

O grande acerto do filme começa pelo diretor, Gary Ross, responsável pelo adorado Seabiscuit – Alma de Herói e do interessante A Vida em Preto e Branco. A experiência de Ross foi decisiva para que ele desse ao roteiro, que adaptou junto com a autora do livro, não desbancasse para algo melódico demais ou abusasse da violência que afastaria o público juvenil para qual a história foi escrita. Mesmo assim, valorizou a tensão da situação de Katniss ao utilizar a câmera tremida, incorporando e angustiando o público que passou a sentir um pouco do sofrimento da moça.

É certo que toda a história sofreu grande influência da obra de George Orwell, principalmente na questão de o Estado possuir um departamento que era responsável por levar à população uma espécie de "pão e circo" unido ao medo, para que mantenha o controle e impeça uma rebelião entre os distritos. Apesar desta forte inspiração, o texto de Jogos Vorazes tem vida própria e um desenrolar mais otimista que a obra de Orwell.

Jennifer Lawrence é uma atriz da nova geração acima da média e prova que não foi por acaso sua indicação ao Oscar ano passado. Ela consegue ser a arrogante e a amorosa sem que haja uma queda em seu desempenho. Josh Hutcherson também se sai bem, mas quem se destaca são os coadjuvantes Woody Harrelson como o mentor dos jovens, Wes Bentley como o diretor do "Big Brother" violento, Stanley Tucci como o sarcástico e eloquente mestre de cerimônias especializado em entreter a massa e um obscuro Donald Sutherland como o presidente.

Um filme inteligente que não exagera tanto no aspecto da ação, deixando Katniss como apenas um ser humano que precisa da ajuda de outros para se manter vivo, quanto no aspecto emotivo, que não deixa a história supervalorizar o romance dos tributos. O longa sofreu comparações com a saga Crepúsculo antes de sua estreia, entretanto quando os créditos sobem, a única certeza é que as semelhanças de contexto e de qualidade são díspares. Que a sorte esteja com Jogos Vorazes e que suas sequências sejam tão boas quanto este é.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Tão Forte e Tão Perto (2011)



Extremely Loud and Incredibly close, 2011. Dirigido por Stephen Daldry. Com Thomas Horn, Tom Hanks, Sandra Bullock, Viola Davis e Max Von Sydow.
Nota: 9.2

Poucos no cinema atual sabem lidar com os traumas e provações humanas como Stephen Daldry. Depois de ser light com a fabulosa epopéia de Billy Elliot, no filme homônimo, passou a explorar, de uma forma mais amarga, a psiquê de seus personagens ante as mais diversas situações limite. Foi assim com a infelicidade multitemporal das mulheres de As Horas (2002), a culpa e o castigo em O Leitor (2008), e agora com o subestimado Tão Forte e Tão Perto, que explora as consequências do 11 de setembro por meio da visão de um jovem introspectivo.

Neste longa, o roteiro de Eric Roth, adaptado do livro de Jonathan Safran Foer, viaja junto com o jovem Oskar Shell (Thomas Horn) aos mais profundos traumas do país, sendo que ele, portador da Síndrome de Asperger (variadas fobias), se tornou uma espécie de fio condutor para um debate mais amplo. A procura do menino pela fechadura correspondente à chave que seu pai havia deixado, permite que interaja com diversos tipos de pessoas, com suas histórias de vida, que, de certa forma, são semelhantes a sua. Aos poucos ele vai percebendo que não era concebido com uma maldição por ter perdido um ente querido.

Daldry esmiuça o sofrimento do jovem, fragmentando-o de maneira a encaixar as peças de acordo com a evolução de sua incursão pelos distritos de Nova Iorque. A montagem não-linear sem demarcações de mudança de tempo, introduz o espectador de forma gradativa, apesar de complexa, à dor generalizada que se abateu, em especial, aos habitantes da cidade. A categoria do diretor vai amarrando o drama do menino aos dos indivíduos que encontra pelo caminho, transformando em um interessante estudo do comportamento da população americana pós 11 de setembro.

O elenco é formidável. Tom Hanks, em pouco tempo, mostra muito do habitual brilhantismo. Sandra Bullock mostra competência, provando que o Oscar conquistado há dois anos não foi sua "aposentadoria". O estreante Thomas Horn cresce em cena a cada segundo em que seu personagem avança em seu sofrimento. É uma grata revelação. Entretanto, quem rouba a cena é Max Von Sydow. O veterano que, sem dizer sequer uma palavra, mostra que sabe lidar com crianças em cena (Vide Pelle, O Conquistador, 1989) e ser sublime, sem caricaturas.

Um bom trabalho, porém visto com certo olhar superficial de alguns críticos, que esperavam um estudo amplo dos efeitos do atentado que chocou os americanos. Contudo, a visão de Daldry ocorre por meio de um único personagem, o que confirma sua excelência como o diretor mais intimista do cinema atual.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Touro Indomável (81)





Raging Bull, 81. Dirigido por Martin Scorcesse. Com Robert De Niro, Joe Pesci e Cathy Moriathy.
Cotação: 9.6

Muitos dizem que os melhores anos do cinema americano foram nas décadas de 40 e 50, com produções que mudaram o curso da história da sétima arte em questões de concepção, no caso de Cidadão Kane (1941), e também que revelaram a capacidade de condensar dramas e melodramas em obras de qualidade ululante como em Casablanca (1943). Seguiu-se um período de outras grandes obras que se imortalizariam na posteridade.

Entretanto, ouso discordar da afirmação. Depois de produções faraônicas, que levaria Hollywood à beira do colapso, os estúdios necessitavam de vida nova, de gente que pensasse e mudasse a concepção de entreter e faturar se se preocupar com conteúdo, que a esta altura, já se encontrava em declínio. Foi com os benditos anos 70, que uma turma de jovens com um pensamento a frente de seu tempo mudaram o panorama. Francis Ford Coppola (O Poderoso Chefão 1 e2, 72/74), Steven Spielberg (Tubarão, 75, e Contatos Imediatos de Terceiro Grau, 77), George Lucas (Star Wars,78) e Martin Scorsese (Taxi Driver,76) salvaram a pátria audiovisual hollywoodiana com filmes que divertiam, porém possuíam um discurso que afastavam suas tramas do lugar comum.

O último grande exemplar desta década de ouro, porém, veio em 1981. Touro Indomável de Scorsese marcou o auge da nova linguagem que, juntamente com seus outros três amigos, instauraram um novo formato de cinema. Todavia, foi ele e Coppola o lado da balança que mostrava o lado “mau” dessa nova era que dava o necessário choque de realidade da qual o ser humano não pode viver sem.

O filme conta a dura e verídica do boxeador Jake LaMotta (Robert De Niro), que conduzia sua vida fora dos ringues com a mesma brutalidade com que derrubava seus adversários dentro dele. A relação conturbada com o irmão/empresário Joey (Joe Pesci) e a obsessão com a esposa Vickie (Cathy Moriaty) fez de LaMotta um dualizado, que vivia em constante guerra de ego do lado humano com o animal.
Scorcesse brincou com a câmera nos pouco mais de duas horas de filme, mostrando um Jake sempre no limite da razão, buscando se entender e tentado nos fazer entender que ele na verdade era um ser humano, apesar de suas atitudes serem opostas. A genialidade do diretor não nos permite fazer nenhum pré-julgamento do personagem, já mescla seu comportamento íntimo com as sangrentas batalhas dentro dos ringues.

A brilhante edição de Thelma Schoemmaker causa a ojeriza do público, mas também os leva a uma análise menos parcial do caso. A relação paranoica com a jovem esposa leva a uma duvida, mesmo que pequena, se o lutador tinha ou não razão. Lembra o brilhantismo de Machado de Assis no seu Dom Casmurro, que todo mundo pensava que o protagonista era um deplorável ser humano, ainda assim seu relato causava dúvidas. Uma verdadeira aula de cinema.

Com uma fotografia em preto e branco de Michael Chapman, poucas vezes bem utilizadas nos tempos modernos, o longa ainda tem a atuação indomável de De Niro (premiado com o Oscar), e competentes de seus coadjuvantes. Um filme que marca não o fim de uma era, mas a transição de um período de uma combinação brilhante, que devolveu a Hollywood seu império, para a década que só obtiveram sucesso, quem utilizou o realismo perturbador de Scorsese e Coppola ou as mensagens subliminares revestidas de efeitos visuais bem empregados.