
Nota: 5.2
(Ainda) Existe cinema
careta no Brasil?
Se o objetivo do diretor Marcos Prado era colidir com seu
conceito de que o cinema nacional é pudico e careta, sua aspiração deu certo. A
linha de Paraísos artificiais
inverte totalmente este conceito ponderado pelo diretor, uma vez que calcado
nos festivais animados pelas festas raves, segue uma linha liberal e nem um
pouco artificial neste aspecto.
Tudo é mostrado de forma
nua e crua (aliás, muito mais nua) em cada passagem do filme. Nele embarcamos
através da bela imensidão paisagística de locações pelo interior do Nordeste a
bordo de um ônibus de viagem onde se encontram as inseparáveis Erika (Natália Dill) e Lila (Lívia Bueno) a caminho da aventura que
irá mudar pra sempre suas vidas. Durante um animadíssimo festival em Recife as
garotas dão de cara com o playboy Nando (Luca Bianchi). Juntos, o trio vive
intensamente todos os prazeres que o badalado festival lhes oferece. Algum
tempo depois, em Amsterdam, Erika se reencontra com o passado ao avistar Nando
numa boate onde trabalha como DJ. O problema é que o galã não se lembra de
tê-la conhecido e, muito menos gerado um fruto deste encontro. Assim, os dois
iniciam um romance mesmo com o fantasma da amiga morta por overdose no mesmo
festival tempo atrás assombrando os pensamentos de Erika. Com o tórrido romance
em território estrangeiro, a DJ descobre o motivo de ter sido abandonada por
ele, preso como mula de tráfico e que por isso amargou anos na prisão.
Até aí uma história
normal de encontros e desencontros quando se lê, mas o problema está em se
situar ao acompanhar a produção. Em pouco mais de 94 minutos o que vimos é uma
vasta gama de flashbacks que evaporam o tempo e a história. Recife, Amsterdam,
vão e vem e passam de forma tão rápida por nossas mentes que fica difícil
processar qualquer informação. Não se sabe quem ou o que está contando. Só
mesmo um inebriante mergulho pelos devaneios do cérebro depois de curtir um
barato para aliviar os efeitos das drogas onipresentes do filme.
Estes exaustivos
flashbacks esvaziam por demais a história, já tão calejada pela transferência
de foco do personagem central. Em primeiro plano, vimos Nando, um jovem
recém-saído da prisão que se martiriza pelo erro e pelo fato de ter deixado a
mãe cuidando sozinha do rebelde irmão caçula (César Cardadeiro). Depois, toma todo o espaço a tristeza remoída
de Erika, que se trabalhada poderia render um pouco mais tanto para o enredo
quanto para sua intérprete. Esta demarcação de território pode ter uma
explicação lógica e quem sabe proposital, afinal, ao que me parece a moça tem
bem mais recursos artísticos para lidar com cenas que exigem tal
“concentração”. Um desperdício total em uma das melhores e mais viscerais
interpretações da promissora Dill quando a mesma teve que lutar contra buracos
negros no roteiro, diálogos pobres e um parceiro que parecia ser o único a se
sentir a vontade com tamanha mesquinhez.
Tirando algumas cenas
interessantes, boas atuações, incluindo do jovem Cardadeiro, o que fica na obra
nem um pouco pudica de Prado é a velha e conhecida máxima de que temos que
curtir tudo, experimentar tudo e todos enquanto ainda somos jovens, ninguém é
de ninguém, a gente é o que a gente sente e por aí vai... Neste aspecto é
impossível afirmar que tenha sido um fracasso e sim, um êxito para o diretor,
que queria provar a materialização de um conceito errôneo sobre o cinema
tupiniquim ousando demasiadamente com uma linguagem libertina e deixando em segundo
plano uma história que, repito um pouco mais bem trabalhada, poderia gerar algo
mais real, concreto, interessante de se ver. Afoito em provar sua concepção,
ele preferiu ilhar seu filme em um mar de pegação e sexo sem sentido num clamor
desnecessário oriundo de seu próprio paraíso artificial.
Como sempre muito boa crítica. Mas acho que pegou pesado com a tentativa de Prado. Porém defendeu sua opinião, e isso basta.
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