Shame, 2012. Dirigido por Steve McQueen. Com Michael Fassbender, Carey
Mulligan e James Badge Dale.
Nota: 9.2
Logo nas primeiras cenas de Shame
percebemos que não se trata de um filme comum, e muito menos que é um trabalho
de um diretor “viciado”, daqueles que seguem uma espécie de manual para conduzir
um longa. Em seu segundo trabalho Steve McQueen, homônimo do consagrado ator
“cool” americano morto em 1980, artista plástico conhecido em seu país mantém a
pegada que o tornou famoso em Hunger (08)
neste drama psicológico que contempla imagens degradantes, voyeurismo e sexo em
seu mais puro descontrole. Novamente ao lado de Michael Fassbender.
O filme conta a história de
Brandon (Fassbender, brilhante), que é bem sucedido no trabalho e mora sozinho
em um apartamento de luxo no centro de Nova York. Tem grandes problemas em se
relacionar com as pessoas e possui um incontrolável vício em sexo, que o leva
aos submundos da prostituição e a sites de conteúdo repulsivo. Toda a
estabilidade que tem com a situação é colocada em xeque quando sua irmã Sissy
(Carey Mulligan, ótima) vai morar com ele, e o pior, precisa de seu apoio.
O roteiro escrito pelo próprio
McQueen junto com Abi Morgan logo nos remete ao último filme de Stanley
Kubrick, De olhos bem fechados (97),
porém é muito mais incisivo e com um dilema moral mais profundo. Logicamente a
forma que Kubrick usou para se referir ao sexo, puxando pelo lado da
infidelidade latente, mas não comprovada, se apega mais ao campo da psique solo
do personagem de Tom Cruise. Neste Shame, a degeneração que Brandon sofre, e
sabe disso, o que justifica a escolha do título, confronta com a instabilidade
que sua irmã está passando, aumentando o grau de desespero da situação.
Fica bem claro que o problema de
Brandon o deixa em um limite absolutamente perigoso, e nas entrelinhas é
pontuado pela tensão sexual incestuosa entre ele e Sissy. O diretor opta por
inserir as cenas de sexo mais impactantes quando a doença do personagem atinge
o nível incontrolável, e são sequências que não abrem mão da classe e a poesia
que se mantém constante desde o início o filme. Até o voraz ménage-a-trois não
escamba para a vulgaridade porque McQueen faz com que o público se prenda às
sensações do protagonista, ficando o sexo no segundo plano. Tudo conduzido por
uma fotografia obscura e trilha sonora melancólica para acompanhar sequências
longas e silenciosas.
Um filme brilhante e subestimado
pela Academia, tanto quanto as atuações excelentes de Fassbender, verossímil
nas cenas de sofrimento sexual de seu personagem, e Mulligan, que mergulha na
agonia incessante de Sissy. É o cult movie do ano, que sem querer (ou não) mostrou
o que poderia ter sido feito na obra mediana de Kubrick, e também que falar de
sexo no cinema não pode ser tabu, e muito menos um amontoado de monótonas cenas
libidinosas e sem sentido concreto.
Chega a causar surpresa ver um filme de língua inglesa como Shame. Há filmes europeus que tratam o sexo de maneira mais direta e honesta, mas no lado de cá do Atlântico isso é raríssimo. Shame é um filme que nos relembra como um entretenimento e uma arte para adultos pode e deve ser. Muito bom.
ResponderExcluirCorretíssimas palavras Gustavo, uma síntese muito feliz.
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