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terça-feira, 7 de maio de 2013

Meninos não choram (1999)


Meninos não choram (Boys don't cry,1999)
Direção: Kimberlly Pierce. Com: Hillary Swanck, Chlöe Sevigny e Peter Sarsgaard.
Nota: 9


Mais que um filme feito pra chorar, Meninos não choram foi um arquétipo perfeito que a diretora Kimberly Pierce usou para deixar evidente o preconceito e por assim fazer refletir. Visando estender os holofotes para a impressionante trajetória da menina Teena Brandon (Hillary Swanck, fantástica), uma garota oprimida que se vê as voltas com a intolerância quanto sua opção sexual. Opção sim, pois diferente de outras visões, Teena não se considerava homossexual. Para a garota franzina, de traços andróginos como "uma estrela de cinema" , ela não era simplesmente uma lésbica e sim um garoto no corpo de mulher. 

Tamanha confusão de identidade sexual foi traduzida na construção física da persona que criara. Começava seu ritual pela manhã, no corte de cabelo, se estendia pelos acessórios que precisava para tal e terminava nos trejeitos de um bom rapaz. Depois de se meter numa confusão na localidade em que mora, Teena se exila na pequena cidade de Falls City, lugar onde costumam "enforcar sapatões". É lá que sua vida muda radicalmente. Primeiro ela faz amizade com um grupo de jovens sem nenhum propósito, que em busca de adrenalina, organizam os mais variados e impensáveis desafios. Em meio a este grupo, encontra-se a jovem Lana Tisdel (Chloë Sevigny, fabulosamente sexy). Uma loira fascinante cujo olhar  hipnotiza à primeira vista e com quem vive um tórrido romance às escondidas. A partir daí a vida de Teena passa a ser de sonhos, o que ela mesma considerava ser um luxo em sua paupérrima existência. Tudo transcorria para seu final feliz, até que o ódio alimentado pelo preconceito de cidade interiorana lhe arranca de forma cruel a possibilidade de continuar sonhando. 

O encanto do filme de Pierce se dá exatamente pela afeição que o espectador tem pela protagonista. Divinamente construída pelo talento de Swanck, Teena nos conquista pelos sonhos, delicadeza, ingenuidade, realçados por sua força de espírito. Elementos apoiados com precisão na atuação premiada da atriz, que em nenhum momento deixa transparecer qualquer tipo de caricatura à personagem. Ela humaniza por demais sua Teena, comovendo e transbordando uma miríade de sentimentos nela inseridos. Sem dúvida, uma das melhores e mais marcantes atuações de todos os tempos. 

No entanto não podemos atribuir somente a belíssima atuação da atriz o chamariz oportuno da obra. Destaca-se também sua parceria mais que perfeita com a belíssima Sevigny, também indicada ao Oscar. A atriz que naturalmente exala uma sensualidade própria empresta tudo isso à sua jovem deslocada, pobre e sem perspectiva. Segundo a atriz "Lana vê em Brandon uma chance de mudar de vida, sair daquela pobreza financeira e espiritual." Desta questão emerge uma química considerável entre as duas atrizes de talento incontestável muito bem captada pelas lentes opulentas da diretora, dona do projeto. Kimberly oferece a ambas tranquilidade e aval necessário paras cenas mais eróticas, e que exige uma entrega total das atrizes. Swank e Sevigny formam uma daquela duplas inesquecíveis que traduzem através de palavras e gestos a mensagem de uma obra moldada com sentimento e o mais puro talento.

Cada quadro é preenchido com cenas de uma empatia atraente, de momentos tensos, diálogos polêmicos e ótimas interpretações. Jeannetta Arnette, como mãe da jovem Lana, fascina pela simplicidade de sua "maluquice". Os atores do núcleo jovem dão veracidade aos problemas frequentemente abordados por esta classe representada no filme. John (Peter Sarsgaard) e Tom (Brendan Sexton III) formam a dupla de inconsequentes, enquanto Kate (Alison Folland) observa passiva sua vida passar e Candace (Alicia Goranson) tem que se contentar em tentar arranjar um marido para criar seu filho. Personagens que de cara conquistam pelos méritos dos atores bem como a dualidade instigante. 

Baseado numa história real, é uma ótima pedida sempre quanto se fala em preconceito e sua raízes nocivas dentro de uma sociedade. Um filme até certo ponto inclassificável, pois  desperta em nós o melhor (o carisma dos personagens e as atuações) e o pior (a tristeza de cenas violentas e o final infeliz). Talvez seja este seu maior mérito. A interação intimista direto com o público. Beleza, drama, torcida, reflexão, indignação. Sentimentos condensados que vão muito além de um simples choro.  



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