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quinta-feira, 12 de abril de 2012

As Horas (2002) - Comemorativo 10 anos



The hours, 2002. Dirigido por Stephen Daldry. Com Nicole Kidman, Julianne Moore, Meryl Streep, Ed Harris, John C. Reilly, Miranda Richardson, Stephen Dillane e Claire Daines.
Nota: 9.4

As horas é uma obra que já nasceu consagrada. Inspirado no revolucionário Mrs. Dalloway, romance da enigmática escritora Virginia Wolff, virou sucesso 70 anos depois nas mãos do escritor Michael Cunningham. Eleito o melhor livro de 1998, vencedor do Pulitzer e do PEN / Faulkner, foi classificada como uma obra não linear e cheia de nuances. Mas isso não faz do livro um bicho de sete cabeças. Pelo contrário. Foram estas características que fizeram com que esta belíssima obra tivesse uma transição segura para o cinema.

Diante de tanto reconhecimento, coube ao talentoso diretor Stephen Daldry, famoso por tornar físico o mundo interior, dar vida às suas instigantes personagens nas telas. O primeiro desafio foi fundir as três histórias e assim, criar uma única narrativa sob a mesma temática com pontos de vista diferenciados para que pudesse surgir uma melhor interação entre elas.  “Achei que a ideia de se ter três histórias, três mulheres e a relação entre elas, era uma maravilhosa oportunidade de tentar criar uma única narrativa.”

Outro desafio foi tentar dar corpo às vozes do interior das personagens naturalmente captadas no livro. Mostrar o espectro que assombra a vida aparentemente normal de cada uma delas. Esteio que ajudou a conduzir fielmente o roteiro de David Hare bem como o trabalho de suas intérpretes.

O filme parte de 1923, ano do processo de criação de Miss Dalloway. Da genialidade à loucura, todos os sentimentos da escritora Virginia Wolff (Nicole Kidman) captados pelas páginas de uma de suas maiores criações. A relação tênue entre amor e ostracismo sentimental para com o marido Leonard (Stephen Dillane), a fidelidade quase que incestuosa para com sua irmã Vanessa (Miranda Richardson), a vida soturna inserida em seu mundo particular, e a angústia exasperante em seus últimos dias. A angustia asfixiante que sufocam seus pensamentos, e a ideia de uma liberdade individual, a levam a um destino inacreditável. A belíssima Nicole Kidman fica irreconhecível no papel da excêntrica escritora, captando com maestria sua personificação física e especialmente, emocional.

Paralelo a isso, em 1951 se encontra a dona-de-casa Laura Brow (Julianne Moore), que teve todos seus desejos de mulher dizimados pelo pragmatismo da sociedade americana. O dia de Laura parece comum a todos os dias de uma mãe de família e senhora do lar. Apesar de bem casada com Dan (John C. Reilly), um marido extremamente devotado, a dor da frustração de não poder expressar seus desejos, a torna uma mãe e esposa tão robótica que sua convivência com o filho transforma-se numa dor desconfortante. As emoções de Laura são captadas em cenas onde o silêncio assume o papel de protagonista. Este silêncio é o que alimenta sua força para tomar a mais séria decisão de sua vida. Tudo isto mesclado com uma interpretação soberba da excelente Julianne, torna inesquecíveis suas sequencias.  

O ano é 2001 e seguimos ao lado de Clarissa Vaughn (Meryl Streep), uma editora que adora dar festas para esconder sua melancolia de seus sonhos enterrados. Clarissa é do tipo de mulher que constantemente assombrada pelo seu passado, não pode viver plenamente seu presente, agarrando-se a uma ideia de felicidade surreal. Sua vida com a parceira Sally (Allison Janney), bem como a relação com a filha Julia (Claire Danes), é minada pela devoção integral para com seu amigo Richard (Ed Harris, ótimo), um poeta frustrado que está em seus últimos dias vítima da AIDS. Clarissa e Richard tiveram uma única noite de amor na juventude. Desde então, esta noite se tornou todos os seus dias. É a partida de Richard que faz com que ela se volta para seu mundo. Meryl Streep empresta toda sua majestade ao dar ênfase aos momentos de emoções ponderadas de Clarissa.

Três mulheres em épocas diferentes, mas com os mesmos anseios de felicidade, oriunda de uma firmação pessoal. Três histórias interligadas pelos pensamentos capciosos de Virginia ao escrever Mrs. Dalloway. O romance lido por Laura anos mais tarde, e sintetizado na figura de Clarissa posteriormente. O triunfo do filme consiste em ligar emocionalmente suas três histórias ao romance, que narra a história de uma mulher, uma heroína diante das dificuldades cotidianas, se personificando em todas as mulheres. Personagens que tendem a praticar atos de heroísmos constantes, a cada 24 horas. Partindo do ponto de ter que estar sempre provando para a sociedade seu valor subjugado. Fato que ultrapassa gerações. “Acredito que o heroísmo na vida das mulheres é constantemente subestimado, ou posto em segundo plano em comparação ao heroísmo na vida dos homens. Obviamente, os esforços são enormes e profundos, e possui a mesma importância”, Stephen Daldry.

Em As horas acompanhamos atentamente o dia destas três mulheres e descobrimos o que estes valiosos minutos nos revelam diante da complicada arte de viver. As relações pessoais, a inquietação sentimental e a dissimulação dos sentimentos. Observações que inadvertidamente podem nos conduzir a repressão das qualidades, direitos e responsabilidades de mulher. As tribulações sentimentais podem dar ao filme um ar de melancolia, mas é certo afirmar que todo este sentimento se esvai com o êxtase de acompanhar três atuações heroicas e históricas. Algo para se aplaudir a cada minuto, cada dia, cada hora, cada ano. Sempre.  

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