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sábado, 13 de setembro de 2014

Crash: no limite entre drama e reflexão

Crash – no limite (Crash, 2005), 
Direção: Paul Haggis.
Com Sandra Bullock, Brendan Fraser, Matt Dillon, Don Cheadle, Terence Howard e Ryan Phillipe. 

Nota: 9

Há quase uma década atrás, o diretor Paul Haggis nos brindou com um daqueles filmes que traz um resquício consequente dos atentados do 11 de Setembro. Momento significativo da história mundial em que o país mais poderoso do mundo na época, percebeu o quanto pode ser vulnerável contra a violência como qualquer outro. Depois que as Torres que sustentavam este Pilar megaeconômico caíram, os EUA tiveram que arranjar alguém para culpar. E esse alguém, ou melhor, alguéns, foram pessoas de diferentes culturas e nacionalidades que passaram a ser pressionadas pelas autoridades. Foi o que chamamos de paranoia seletiva.

Aproveitando dessa brecha, Haggis escreveu uma obra que trata exclusivamente de preconceito em todas as suas tramas. Um emaranhado de histórias começa a se desenvolver e depois se colidem em seu roteiro fascinante. Tudo começa com o roubo do carro do Promotor da cidade, o bonitão Rick (Brendan Fraser). Rick e sua mulher Jean (Sandra Bullock) são representantes da elite branca do filme, que para fugir do rótulo, tentam ser complacentes na rua com a dupla de assaltantes negros. Em vão. Os dois amigos rodam pela cidade aprontando todas e se envolvendo em muitas histórias, até que um deles é morto pelo policial Hanson (Ryan Phillipe). Um jovem idealista branco que só quer ser um bom policial acima de tudo e por isso desaprova os métodos antiprofissionais de seu parceiro Ryan (Matt Dylon), como por exemplo constranger uma mulher negra (Thandie Newton) diante de seu marido, o submisso diretor de TV (Terrence Howard) durante uma blitz. No decorrer de toda a história, Hanson irá descobrir que em Los Angeles não há nenhum lado certo ou errado e que todos estão sujeitos a atravessar a linha tênue que separa estes dois lados.

Assim horas depois, enquanto Ryan salvava a vida da mesma mulher que havia constrangido, Hanson se vê numa situação tensa e depois complicada após dar carona para um jovem negro, irmão do Detetive orgulhoso Graham Waters (Don Cheadle). Impulsionado pelo medo, ele acredita que será atacado pelo jovem quando este leva a mão no bolso. Então o policial exemplar age por impulso atirando na cabeça do seu possível algoz. Sua convicção de princípios cai por terra quando percebe que o jovem trazia consigo não era uma arma de fogo e sim uma imagem de São Cristóvão, o padroeiro dos viajantes, a mesma que ele tinha em seu carro. Um erro absolutamente e absurdamente comum naqueles tempos, porém fatal para a queda de alguns preceitos.

O policial Hanson em dois momentos:
como o policial boa praça e o assassino de um negro 

Todas as tramas que se sucedem paralelas, retratam com exatidão tudo que nos mostra a história construída por diferentes civilizações e depois de uma tragédia, moldada pelo preconceito, o ato de se julgar alguém sem ao menos conhecer. Afinal, até que ponto você mesmo se conhece? É isso que impulsiona os mais de 110 minutos de um filme brilhante, com uma mensagem bem clara para os EUA e para o mundo. Não há uma atuação arrebatadora que seja digna de indicação ao Oscar - embora Matt Dylon tenha sido contemplado com isso - e muito menos de levar pra casa a estatueta, o que não aconteceu. A meu ver de forma justa. As interpretações do elenco são formidáveis de forma linear, afinal, em um monte de histórias, ninguém poderia se sobressair mais que o outro, senão correria o risco de deixar a massa desandar. Inclusive aqui, Bullock já dava sinais de seu talento para o drama.

Indicado ao Oscar em 6 categorias em 2006, sendo vencedor de 3, incluindo Melhor Filme, Crash, que em português de Portugal tem o pertinente título de Colisão, é uma daqueles filmes feitos especialmente para assistir, gostar e depois da belíssima canção In the deep, refletir. Não chega a ser uma obra-prima de padrões colossais, mas cumpre com competência aquilo que é exigido. Desmembrar as reações, interações humanas de diferentes ângulos e âmbitos em uma realidade multicolorida e complexa: negros, brancos, muçulmanos, asiáticos, latinos, pobres, ricos. Nisso se torna um filme imperdível e inesquecível para as várias épocas e seus limites da intolerância. 

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