Crash – no
limite (Crash, 2005),
Direção: Paul Haggis.
Com
Sandra Bullock, Brendan Fraser, Matt Dillon, Don Cheadle, Terence Howard e Ryan
Phillipe.
Nota: 9
Há quase uma década atrás, o diretor Paul Haggis nos brindou com um daqueles
filmes que traz um resquício consequente dos atentados do 11 de Setembro.
Momento significativo da história mundial em que o país mais poderoso do mundo
na época, percebeu o quanto pode ser vulnerável contra a violência como
qualquer outro. Depois que as Torres que sustentavam este Pilar megaeconômico
caíram, os EUA tiveram que arranjar alguém para culpar. E esse alguém, ou
melhor, alguéns, foram pessoas de diferentes culturas e nacionalidades que
passaram a ser pressionadas pelas autoridades. Foi o que chamamos de paranoia
seletiva.
Aproveitando dessa brecha, Haggis escreveu uma obra que trata
exclusivamente de preconceito em todas as suas tramas. Um emaranhado de
histórias começa a se desenvolver e depois se colidem em seu roteiro
fascinante. Tudo começa com o roubo do carro do Promotor da cidade, o bonitão
Rick (Brendan Fraser). Rick e sua mulher Jean (Sandra Bullock) são
representantes da elite branca do filme, que para fugir do rótulo, tentam ser
complacentes na rua com a dupla de assaltantes negros. Em vão. Os dois amigos
rodam pela cidade aprontando todas e se envolvendo em muitas histórias, até que
um deles é morto pelo policial Hanson (Ryan Phillipe). Um jovem idealista branco
que só quer ser um bom policial acima de tudo e por isso desaprova os métodos
antiprofissionais de seu parceiro Ryan (Matt Dylon), como por exemplo
constranger uma mulher negra (Thandie Newton) diante de seu marido, o submisso
diretor de TV (Terrence Howard) durante uma blitz. No decorrer de toda
a história, Hanson irá descobrir que em Los Angeles não há nenhum lado certo ou
errado e que todos estão sujeitos a atravessar a linha tênue que separa estes dois lados.
Assim horas depois, enquanto Ryan salvava a vida da mesma mulher que havia
constrangido, Hanson se vê numa situação tensa e depois complicada após dar
carona para um jovem negro, irmão do Detetive orgulhoso Graham Waters (Don
Cheadle). Impulsionado pelo medo, ele acredita que será atacado pelo jovem
quando este leva a mão no bolso. Então o policial exemplar age por impulso
atirando na cabeça do seu possível algoz. Sua convicção de princípios cai por
terra quando percebe que o jovem trazia consigo não era uma arma de fogo e sim
uma imagem de São Cristóvão, o padroeiro dos viajantes, a mesma que ele tinha em seu carro. Um erro absolutamente e absurdamente comum naqueles tempos, porém
fatal para a queda de alguns preceitos.
O policial Hanson em dois momentos: como o policial boa praça e o assassino de um negro |
Todas as tramas que se sucedem paralelas, retratam com exatidão tudo que
nos mostra a história construída por diferentes civilizações e depois de uma
tragédia, moldada pelo preconceito, o ato de se julgar alguém sem ao menos
conhecer. Afinal, até que ponto você mesmo se conhece? É isso que impulsiona os
mais de 110 minutos de um filme brilhante, com uma mensagem bem clara para os
EUA e para o mundo. Não há uma atuação arrebatadora que seja digna de indicação
ao Oscar - embora Matt Dylon tenha sido contemplado com isso - e muito menos de
levar pra casa a estatueta, o que não aconteceu. A meu ver de forma justa. As
interpretações do elenco são formidáveis de forma linear, afinal, em um monte
de histórias, ninguém poderia se sobressair mais que o outro, senão correria o
risco de deixar a massa desandar. Inclusive aqui, Bullock já dava sinais de seu
talento para o drama.
Indicado ao Oscar em 6 categorias em 2006, sendo vencedor de 3,
incluindo Melhor Filme, Crash, que em português de Portugal tem o pertinente título de Colisão, é uma daqueles filmes feitos especialmente para
assistir, gostar e depois da belíssima canção In the deep, refletir. Não chega a ser uma obra-prima de padrões
colossais, mas cumpre com competência aquilo que é exigido. Desmembrar as
reações, interações humanas de diferentes ângulos e âmbitos em uma realidade
multicolorida e complexa: negros, brancos, muçulmanos, asiáticos, latinos, pobres, ricos. Nisso se torna um filme imperdível e inesquecível para as várias épocas e seus limites da intolerância.
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