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quinta-feira, 18 de outubro de 2012

E não foram felizes para sempre...

O segredo de Brokeback Mountain
A ausência dos famosos Happy Ends no cenário de filmes com temática gay gera uma inquietude particular por parte de uma camada considerável de fãs românticos do cinema

Tudo começa com uma tímida troca de olhares, uma conversa geralmente banal, e de repente um toque despretensioso e pronto! Fez-se a mágica! O casal segue os instintos, usam seus atributos pessoais para iniciar uma relação e alguns, mais físicos, para tentar mantê-la longe das intrigas, ciúmes, dúvidas, inseguranças. Enfim, todos os ingredientes indispensáveis para antagonizar os prós de uma história de amor, que de certo irá nos remeter ao ansiado final feliz.

Contudo, há certa parcela deste seleto grupo de casais apaixonados que não conseguem usufruir desta mesma condição. Trata-se dos protagonistas dos instigantes filmes de temática gay. Geralmente envoltos de turbulências sentimentais que nos direcionam a uma constante frustração, estas obras contam com todos os elementos necessários para se moldar um emocionante enredo de amor. Tudo está lá, em seu devido lugar. Os mesmos dramas, as cenas apaixonantes com juras de amor eterno temperadas com beijos ardentes. A diferença é de que no decorrer da trama o galã prefira o ele; e a mocinha a ela. Os ingredientes indispensáveis para uma boa história de amor, que de certo irá nos remeter a um final... Infeliz, criando assim uma incômoda sensação de melancolia que instiga um pertinente porquê.

Meninos não choram (1999)
Ao tratar de um tema tão delicado quanto à homossexualidade nas telas, Hollywood opta na maioria das vezes por centralizá-las em tramas mais densas, elevando a contundência da complexidade que envolve os sentimentos de cada personagem inserido na história. Esta fórmula particular alimenta o lado dramático da produção, deixando em segundo plano a poesia do romance. Vivenciar em todos os seus moldes este apelo emocional se faz de obras inesquecíveis. Por esta caracterização partem os filmes mais relevantes do gênero, os chamados oscarizáveis. Pérolas como Filadélfia (1991), Meninos não choram (1999), O Segredo de Brockeback Mountain (2006) e Milk- a voz da igualdade (2009) passearam com justiça pelo tapete vermelho. Sendo que a maioria deles tem algo mais peculiar, como revelar o lado real de toda história envolta de intolerância e dor. Uma das razões pelas quais elas assumem um caráter mais reflexivo, deixando de lado as cores da vida. Afinal, como pintar algo colorido no final deste arco-íris quando a vida real nos remete a cores tão insípidas e nebulosas?

Meu amor de verão (2004)
Outro fator que também é considerável nesta questão é a construção exaustiva dos personagens dentro desta temática. Na maioria dos scripts, o homossexual geralmente é descrito como um ser humano perturbado, isquêmico, insano. Perde totalmente a racionalidade. Coisas da paixão? Não acredito que seja apenas por isto. É verdade que quando alguém se sente atraído por outro alguém do mesmo sexo, a descoberta da identidade sexual se faz difícil, complicada, inquietante. Elementos que geram uma ótima sinopse. Mas chegar ao final de toda a trama carregando o peso deste “pecado” de amar torna as coisas mais previsíveis para que o “juízo final” se torne inevitável, implacável e triste. Tópicos acentuados em filmes adolescentes do gênero como Assunto de meninas (2001), cujo título original é Lost and delirius (perdidas e desvairadas); e Meu amor de verão (2004), em que vemos uma garota tentar afogar a amante num lago na cena final. Ainda tem Almas gêmeas (1995) de Peter Jackson, que embora seja baseado numa história real, mostra duas adolescentes que se entregam ao lado vil de sua essência e arquitetam um brutal assassinato da mãe de uma delas. Obras de qualidade inquestionável, mas que pecam quando deveriam mostrar ao público remetente justamente o contrário. Ou será que se apaixonar por alguém do mesmo sexo sempre vai significar se entregar totalmente ao lado obscuro da natureza humana?

Embora no decorrer das tramas se tente mostrar os homossexuais com a mesma aptidão de sentimentos que os outros, todo o ato transcorrido de traçar uma cortina de fumaça oportuna para igualar as identidades acaba não dizimando o preconceito no final, pois tira do público a chance de acreditar que todos nós somos iguais e merecemos usufruir de tais privilégios. Vistas constantemente da mesma ótica só faz acentuar a fragilidade das relações homossexuais e em nada acrescenta a mensagem de que se pode sim encontrar o pote de ouro no final do arco-íris sendo quem você é e sendo feliz em sua liberdade de escolha. Obter a Paz de espírito pelo menos através das telas, ratificando a frase primorosa de Fellini: “O cinema é um modo divino de contar a vida”. E o que seria mais divino do que contar (e exaltar) o amor?

Para alguns, a razão de toda esta tristeza gay no cinema tem as raízes nos poderosos que comandam Hollywood. Os mesmos que vetaram o reconhecimento cinematográfico de A paixão de Cristo, obra-prima de Mel Gibson. Eles decidem quem ou que irá apresentar em seu solo sagrado. Se o filme não vende para o público, não tem chance de embelezar sua história. O mesmo público que prefere assistir o drama e a tragédia nas histórias homossexuais do que enxerga-los como igual. A tolerância vai até o beijo na boca, a cena mais ousada, mas tudo sempre tem que dá errado no final. Ou seja, o que realmente conta é o infelizes para sempre. Lembrando uma colaboradora “sincera” de um blog (que infelizmente não me lembro de qual) que escreveu “tudo que é errado, tem que terminar errado.”.   

Imagine eu e você (2005)
Nem mesmo a bela e autêntica obra israelense Segredos íntimos (2007) escapa deste veredicto. No filme vimos como uma jovem judia prometida em casamento tenta se encontrar num seminário judeu para moças, entrando em conflito com as tradições de sua religião e com os desafios de encarar sem receios sua própria sexualidade ao se apaixonar por uma de suas colegas. À principio, tanto o amor quanto os ideais de ambas são recíprocos, mas bastou um rapaz se interessar por uma delas para vencer as leis da tradição judaica. E tudo terminou com a (bela) e oportuna cena de um casamento final.

A todos aqueles que ainda têm esperanças de ver casais homossexuais se regozijando com seu merecido júbilo nas telas, resta recorrer às comédias bobas e apelativas, que convenhamos, nada tem a acrescentar à temática, pois se exime da seriedade do assunto, criando caricaturas de seres humanos e induzindo o público a confortabilidade de seu preconceito num triste papel das novelas nacionais.

Para que se tenham mais obras que possam tratar o homossexual no cinema com a fidelidade de seres humanos que são, com direito a todo o pacote de sentimentos, sem rótulos, moldados apenas da mesma matéria que todos, é preciso se despir de preconceitos básicos, dos pecados originais. A mudança tende a partir de nós mesmos, para que se venda a ideia de um final mais digno e merecedor pra quem também conhece a arte de exaltar o amor. Neste espaço, indico a obra britânica Imagine e eu e você (2005), uma produção não muito badalada, mas riquíssima de valores em que vimos todos os personagens tratados sem estereótipos e o amor é o que move qualquer tipo de relação, bem como respondeu a protagonista Rachel (Piper Perabo) quando perguntada se ela e sua pretendente eram lésbicas: “Não importa do que você quiser chamar”. Ah, e no final ela e sua Lucy (Lena Header) terminaram juntinhas. Sem dramas, lágrimas de rejeição ou apelos, mostrando que se pode sim contemplar uma ofuscante luz deste belo arco-íris.

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